quarta-feira, 22 de outubro de 2014

"Pedro"

Pedro amarrou o cadarço dos seus tênis sentado na beira da cama, ergueu um pouco a cabeça - o bastante para enxergar ao redor do seu quarto - e admirou seus próprios medos. O contratempo abastecia muito as vanglorias que quase sempre permaneciam miúdas e silenciosas. Pedro deixou de sentir muitas coisas, mas não entregou seus medos aos ares. Onde há amor, há medo. Se o medo acabasse, não haveria mais amor. E Pedro sabia que não era possível viver sem medo. O terror que era tapar buracos às escondidas, numa desavença, afim de não ser visto, mas cuidando, ajeitando; mesmo que doloroso - porque ninguém percebia ou se importava - era uma dádiva que Pedro não deixava escapar. Pedro sempre escutou que a dor precisa ser sentida. E agora faz sentido. Aceitar tal condição dói o suficiente para Pedro sentir seus cotovelos ásperos e escuros. E também limita a sua sede de criar laços e ir contra a maré. Por muito tempo pensou ''para que viver se haverá dor?''. Essa sisma antecipada é uma das que ele rejeitou. Pedro parou de pensar nisso. Agora Pedro vive. Vive com muito medo, mas vive.

Um comentário:

  1. Sei que inspiração não vem assim, de uma hora para outra... Mas gosto de ler você, podia publicar mais.

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